terça-feira, 29 de outubro de 2013

REESTRUTURAÇÃO DA PGE-AP: um sonho que se torna realidade

Com a reestruturação da Procuradoria-Geral do Estado, o Governo do Amapá dá um grande passo no sentido de melhorar a qualidade dos serviços públicos oferecidos pelos Órgãos e Secretarias. Apesar das dificuldades iniciais e da natural tendência a sofrer retaliações por parte de políticos da oposição, o atual Governo Estadual vem tomando decisões corajosas que tendem a render bons dividendos num futuro não muito distante. E isso é fácil de comprovar. Como todos sabem, um dos maiores filões da corrupção consiste nas fraudes nas licitações, que resultam em compras e contratações de serviços superfaturados, inviabilizando os investimentos indispensáveis em áreas prioritárias como Saúde, Educação e Segurança Pública. Vencer esse círculo vicioso não é uma tarefa fácil para nenhum Governo, uma vez que os processos licitatórios ocorrem dentro das Secretarias e Órgãos, cujos gestores são políticos que não abdicam facilmente da prerrogativa de manter sob seus comandos a realização das licitações das compras e contratações de serviço a cargo da Secretaria ou do Órgão que dirigem. A certeza de que as coisas caminham na direção certa é que o Governo, em perfeita sintonia com os anseios do povo, decidiu reestruturar a Procuradoria-Geral do Estado e centralizar todas as licitações para compras e contratações de serviço no âmbito da Instituição, que em parceria com a Procuradoria-Geral do Estado do Ceará, está preparando profissionais para que conduzam os processos licitatórios com total imparcialidade, observância das normas que regulamentam a matéria e a mais absoluta transparência dos procedimentos, visando evitar manobras prejudiciais aos interesses do Estado. Com a criação da Central de Licitações, cujo funcionamento ocorrerá brevemente, o Governo do Estado deu um golpe de morte na corrupção. Com a economia que o Estado terá com as compras e as contratações de serviço, certamente haverá sobra de recursos para investir nas áreas carentes de investimentos, com prováveis melhoras na qualidade dos serviços de Saúde, Educação e Segurança Pública. E não é só isso. A louvável decisão de reestruturar a Procuradoria-Geral do Estado acaba de ser publicada na Agência Amapá de Notícias. Confira: "Governador Camilo Capiberibe garante reestruturação da Procuradoria-Geral do Estado." E como se vê pelo relato a seguir, trata-se de um projeto de alto alcance para a Administração Pública do Estado. Confira: "O governador Camilo Capiberibe encaminha nesta quarta-feira, 30, à Assembleia Legislativa do Amapá o Projeto de Lei Complementar que organiza a Procuradoria-Geral do Estado (Prog/AP), cria a Central de Licitação e estabelece o Estatuto dos Procuradores. De acordo com o governador, o Projeto de Lei vai possibilitar à Procuradoria readequar sua estrutura organizacional, implantar novos procedimentos e carreira, permitindo a realização de concurso público. 'Com a reestruturação, a supervisão técnica das estruturas jurídicas dos órgãos de governo da administração direta e das indiretas que não possuírem procuradorias próprias vão ter suporte jurídico aos gestores públicos, dotando-os de condição para tomar decisões em conformidade e voltadas para o efetivo interesse público', diz a mensagem do governador Camilo Capiberibe, que foi encaminhada à Assembleia Legislativa. A estrutura atual da Prog é composta de 26 setoriais e será acrescida de mais 11. 'Entre elas, a Coordenadoria de TI, o Centro Jurídico, o Centro de Perícias e Cálculos Judiciais, além da divisão das Procuradorias Especializadas com a incorporação de núcleos, a implantação de funções de análises técnicas e a da Central de Compras de Licitações do Estado do Amapá', esclarece o procurador-geral do Estado, Antonio Kleber." Com a aprovação do Projeto de Lei Complementar que reestrutura a Procuradoria-Geral do Estado, o Estado contará com uma Procuradoria em melhores condições para atender a crescente demanda dos Órgãos e das Secretarias, sem esquecer que terá uma moderna Central de Licitações de relevância capital para a racionalização dos contratos de compras e prestações de serviço do Estado. A esse respeito, encontramos na Agência Amapá de Notícias: "Central de Licitações. 'O Governo do Amapá dá um importante passo para a implantação de um novo modelo de aquisições públicas que promete reduzir gastos, evitar superfaturamento e agilizar as compras do Executivo Estadual', destaca o governador Camilo Capiberibe, sobre a criação da Central de Licitações do GEA." Mas não é só isso. Outras iniciativas estão sendo adotadas no sentido de melhorar o Estado, como podemos analisá-las a seguir. Em razão das inadimplências com Órgãos Federais, o Estado do Amapá há muito tempo estava impedido de ter acesso a crédito dos Bancos Públicos e de Convênios com Ministérios e Instituições Federais. Essa barreira, como é natural, limitava ainda mais a já reduzida capacidade de investimento do Estado. Com a solução dos problemas da inadimplência, o Estado do Amapá teve acesso a créditos junto ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social – BNDES e à Caixa Econômica Federal – CEF, recuperando, assim, a sua capacidade de investimento em infraestrutura e na compra de equipamentos indispensáveis a um melhor funcionamento da rede Pública de Saúde, da Educação e da Segurança Pública, além de equacionar as deficiências no sistema elétrico, indispensável para que o Estado receba investimentos privados necessários para a geração de empregos e riquezas. Com as medidas acima referidas, e mais algumas outras que estão sendo adotadas, não fica difícil concluir que o Estado do Amapá terá dias melhores num futuro não muito distante.

segunda-feira, 28 de outubro de 2013

OS TRABALHADORES RURAIS PASSARAM A TER DIREITOS PREVIDENCIÁRIOS E TRABALHISTAS NOS GOVERNOS MILITARES NA DÉCADA DE 1970

           Obrigado ao homem do campo Pela madeira da construção Pelo couro e os fios das roupas Que agasalham a nossa nação Pelo couro e os fios das roupas Que agasalham a nossa nação Obrigado ao homem do campo O boiadeiro e o lavrador O patrão que dirige a fazenda O irmão que dirige o trator (Dom e Ravel)
           Programa de Assistência ao Trabalhador Rural - PRORURAL: No bojo das preocupações dos militares no tocante às questões relativas ao campo, a que teve maior alcance social foi, sem dúvida, o Programa de Assistência ao Trabalhador Rural (PRORURAL), instituído pela Lei Complementar nº 11, de 25.05.1971, que consistia na prestação dos seguintes benefícios: aposentadoria por velhice; aposentadoria por invalidez; pensão; auxílio-funeral; serviço de saúde; serviço social.

           Nada era mais degradante de que a situação do trabalhador rural no Brasil antes da aludida Lei, tendo em vista que trabalhava até quando a saúde permitia e, depois, na velhice, quando mais carecia de meios de sobrevivência, ficava na dependência de parentes que, quase sempre, não dispunham de condições para lhe proporcionar uma existência digna. É verdade que, de início, o benefício era de apenas metade do que se paga atualmente, mas foi partindo desse ponto que a sociedade foi tomando consciência da importância da medida e, graças às pressões dos movimentos sociais, o trabalhador rural adquiriu a condição de segurado especial, fato consagrado na Constituição de 1988, tendo, doravante, pelo menos, o necessário para sobreviver em caso de doença e na velhice, quando não mais pode trabalhar.

           Neste País, nenhuma medida tomada até os dias atuais teve maior alcance social do que o PRORURAL. É louvável a sensibilidade que teve o Constituinte de 1988 ao inserir na Constituição dispositivo que deu ao trabalhador rural essa condição de segurado especial, proporcionando a milhares de idosos e inválidos, que foram trabalhadores rurais, condições para viverem com relativa dignidade, em função de benefícios que percebem da Previdência Social.

           Direitos trabalhistas dos trabalhadores rurais: A falta de uma legislação trabalhista que amparasse o trabalhador rural foi sem dúvida uma das maiores injustiças corrigidas pelos governos militares, o que, por razões diversas, não encontrou guarida em nenhum outro governo, nem mesmo no de Getúlio Vargas, que se intitulou como “o pai dos pobres”. Em razão disso, o problema perdurou por muito tempo, mesmo depois de ter sido instituída para o trabalhador urbano.

           Esse problema, mesmo que com algumas incoerências em relação ao que dispõe a CLT, acabou sendo regulamentado pela Lei nº 5.889, de 8 de junho de 1973, e o Decreto nº 73.626, de 12 de fevereiro de 1974. Não era concebível que uma classe tão importante no contexto social do país ficasse eternamente esquecida e desamparada, sendo espoliada pelos latifundiários, como se verificou ao longo de vários séculos.

sábado, 26 de outubro de 2013

REFORMA AGRÁRIA. A PRESIDENTE DILMA ESPEROU TRÊS ANOS PARA INICIAR AS DESAPROPRIAÇÕES DE TERRAS EM SEIS ESTADOS

           "Obrigado ao homem do campo O boiadeiro e o lavrador O patrão que dirige a fazenda O irmão que dirige o trator Obrigado ao homem do campo O estudante e o professor A quem fecunda o solo cansado Recuperando o antigo valor" (Dom e Ravel)
           Muito embora o Brasil disponha de grandes extensões de terra, a distribuição desta sempre foi um desafiou para os sucessivos Governos. O acesso às terras no Brasil sempre se processou de maneira desigual, evidenciando a influência do poderio econômico dos grandes latifundiários. É um problema com raízes profundas na história brasileira, desde o período da colonização.

           Inicialmente, com a posse da terra "Brasilis" pelos portugueses. Posteriormente, na tentativa de colonização, foi implantado o sistema de capitanias hereditárias, cuja distribuição de terras foi feita em forma de doações a portugueses que tinham grandes posses. Em assim sendo, sempre são bem vindas todas as notícias que tratam desse tema. Os governos do PT, dos quais se esperavam muito, não corresponderam as expectativas. Por isso são alvissareiras notícias como as que estão sendo publicadas na Revista Época. Eis aí o que a matéria publicada na Revista:

           "A presidente Dilma Rousseff assinou oito decretos de desapropriação de terras para a reforma agrária em seis Estados. As propriedades, declaradas de interesse social, somam pouco mais de 4,7 mil hectares e estão localizadas em Goiás, Bahia, Sergipe, Tocantins, São Paulo e Santa Catarina. As desapropriações foram publicadas na edição desta sexta-feira (25) do Diário Oficial da União. Na semana passada, durante a cerimônia de lançamento do 'Plano Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica – Brasil Agroecológico', a presidente e o ministro do Desenvolvimento Agrário, Pepe Vargas, anunciaram que, até o fim de 2013, serão publicados 100 decretos de desapropriação de terras para a reforma agrária no país."

           Em face da enorme demanda de terra para efeito de Reforma Agrária, 4,7 mil hectares pouco representam. A questão é de fato de difícil solução. É o poder econômico e político dos donos da terra se manifestando. Os latifundiários, além do poder econômico, sempre detiveram também a força política, razão das dificuldades de se levar à frente um projeto consistente de reforma agrária. Pode-se afirmar que a Constituição brasileira de 1946 foi a primeira que apresentou uma proposta de reforma agrária, vinculando o uso da propriedade ao bem-estar social e prevendo a indenização em dinheiro para as terras desapropriadas. Comenta Strazzacappa (2006, p.38):

           "É com a Constituição de 1946, promulgada no governo de Eurico Gaspar Dutra, que surgem as primeiras propostas de reforma agrária, condicionando o uso da propriedade ao bem-estar social. Estava assim retomado o princípio da função social da propriedade. Vislumbrava-se a execução de uma reforma agrária, uma vez que essa Constituição dispunha sobre a necessidade de desapropriar terras, atendendo aos interesses sociais. Previa até indenização em dinheiro para as terras desapropriadas."

           A reforma agrária prevista na Constituição de 1946 não avançou em sua proposição, pois o governo, aproveitando-se do pretexto da indenização em dinheiro para o pagamento das terras desapropriadas, alegava falta de recursos do Tesouro para realizá-la. Quando falta vontade política, sempre existem pretextos para se protelar a resolução do problema. E não podemos esquecer ainda que se tivemos algumas decisões favoráveis à causa da Reforma Agrária muito se deve ao Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra - MST, que desde meados da década de 1980 tem feito fortes pressões, tanto que conseguiu avanços significativos na Constituição de 1988. E ainda continua pressionando, segundo se comprova pela matéria publicada na Revista Época. Confira:

          "Nos dias anteriores, manifestantes de trabalhadores rurais e do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) fizeram protestos em vários Estados pedindo a retomada das desapropriações. Segundo eles, a presidência não havia assinado nenhum decreto de desapropriação de terra com esses fins em 2013. Foi o menor índice desde 1992, quando foram publicados quatro decretos. Dilma disse no evento que o país assentou muitas famílias e que o ministro Pepe Vargas avançou no método de desapropriação de terras, fazendo uma avaliação da viabilidade produtiva dos assentamentos. De acordo com o Incra, os 100 imóveis rurais a serem desapropriados até o fim do ano somam 200 mil hectares e devem receber aproximadamente 5 mil famílias."

           O mais preocupante, no entanto, é que dentre os vários conflitos de terra, quem mais perde são as partes mais fracas, tanto que entre os vários protagonistas sociais nos conflitos de territorialidade na Amazônia, os indígenas são os mais fragilizados pela ausência de políticas públicas eficientes para resolver o problema. Em outros Estados e regiões, os conflitos também são frequentes. No Nordeste, o Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra – MST tem destacada atuação nos estados do Maranhão, Bahia e Pernambuco. Mato Grosso, no Centro-Oeste, Minas Gerais e São Paulo, no Sudeste, além do Paraná e Rio Grande do Sul, na Região Sul, também são palcos de muitos atritos. Atualmente, as disputas por terras no Rio Grande do Sul tomaram proporções alarmantes, tendo o Ministério Público decidido interferir na atuação do Movimento, sob o argumento de que este estaria infringindo a Lei nº 7.170/83, que define os crimes contra a segurança nacional e a ordem política e social. Em razão disso, o MST denunciou na Organização das Nações Unidas – ONU e na Organização dos Estados Americanos – OEA a tentativa de “criminalização” dos sem terra, conforme notícia publicada no site do MST e em jornais de circulação nacional.

           O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST, de há muito, pressiona as autoridades brasileiras sobre o porquê de a política de assentamento de trabalhadores rurais adotada, no momento, caminha em passos muito lentos, não atendendo, desse modo, às expectativas dos que necessitam de terra para trabalhar. As tentativas já realizadas no sentido de redistribuir terras através de financiamentos também não satisfizeram os anseios dos necessitados, daí por que a sociedade tem uma sensação de que a reforma agrária brasileira é apenas uma ficção.

           A vitória do presidente Lula nas eleições de 2002 reacendeu as esperanças dos trabalhadores rurais sem terra, o que de certa forma motivou mais uma enorme frustração, tendo em vista que no governo dele o número de assentados foi bem menor do que no governo anterior, que nos seus oito anos de mandato distribuiu terras para cerca de 500 mil trabalhadores rurais. Resta saber agora se a Presidente Dilma cumprirá com a sua promessa de desapropriar os 100 (cem) imóveis rurais até o final deste.

JÂNIO QUADROS E JOÃO GOULART PRIORIZARAM AS ATIVIDADES DO CAMPO

           "Brasil, um sonho intenso, um raio vívido De amor e de esperança à terra desce, Se em teu formoso céu, risonho e límpido, A imagem do Cruzeiro resplandece. Gigante pela própria natureza, És belo, és forte, impávido colosso, E o teu futuro espelha essa grandeza. Terra adorada, Entre outras mil, És tu, Brasil, Ó Pátria amada! Dos filhos deste solo és mãe gentil, Pátria amada, Brasil!"
           O início dos anos sessenta juntou instabilidade política e crise econômica. Sem conseguir aliar apoios políticos que sustentassem suas iniciativas, os dois presidentes civis que sucederam JK tiveram governos curtos e desastrosos. Jânio Quadro renunciou em 1961, e João Goulart, seu sucessor, foi deposto em 1964. O presidente Jânio Quadros teve, no entanto, uma grande preocupação com as questões afetas ao campo, tanto que, logo no início do seu governo, instituiu um grupo de estudo com a finalidade de analisar esse problema e, como resultado, o Banco do Brasil criou unidades móveis de Crédito Rural, com a denominação de Movec, cujo objetivo principal era ir aos lugares mais distantes com oferta de crédito para atender aos pequenos produtores rurais que tinham dificuldades para se locomover.

           A esse respeito seguem as informações de Nóbrega (1985, p.57): "Em 1961, como decorrência dos estudos do grupo de trabalho instituído pelo presidente Jânio Quadros, o Banco do Brasil criou as Unidades Móveis de Crédito Rural – Movec, que eram constituídas de equipes que se deslocavam às zonas não servidas por agências, para conceder crédito in loco aos produtores de menor porte. As Movec trabalhavam em articulação com as lideranças dessas áreas – prefeitos, padres, presidentes de associações rurais, etc -, que se encarregavam de divulgar amplamente a presença dos funcionários do Banco do Brasil, em dias certos, para colher propostas, preparar cadastros e conceder crédito."

           No início dos anos sessenta, havia uma necessidade de o governo priorizar o problema da agricultura. O país estava começando a se industrializar e à medida que avançasse o processo de industrialização teria que: “aumentar a produção agrícola, para fornecer às indústrias nascentes matérias-primas, e às pessoas das cidades, alimento; liberar a mão-de-obra necessária para o processo de industrialização.”

O momento havia chegado e o governo tinha necessidade de agir, sob pena de comprometer a viabilidade do país, motivo que justifica ter surgido a primeira tentativa de criar uma legislação própria para o crédito rural através de um grupo de trabalho criado pelo Memorando Presidencial no. 38/61, de 3 de março de 1961, do presidente Jânio Quadros ao ministro da Fazenda. A diretriz presidencial não deixava de estar influenciada pela idéia de que ao crédito rural deveria ser reservada a principal tarefa de incentivar e apoiar a agricultura brasileira. Mas é certo que o elenco de recomendações inaugurava uma nova etapa, em que as preocupações também se estendiam à assistência técnica associada ao crédito e ao treinamento do pessoal envolvido com a administração dos programas oficiais de financiamento à agricultura.

           Como resultado dos trabalhos do grupo, foi baixado o Decreto no. 50.637, de 20 de maio de 1961, criando o Grupo Executivo de Crédito Rural – GECRE, com as seguintes atribuições: formular a política de crédito rural do País, estabelecendo as prioridades, as linhas de crédito e os zoneamentos dentro dos quais devem atuar os diversos órgãos executores; tomar todas as providências necessárias no sentido de coordenar o crédito rural e conseguir o seu entrosamento com os serviços de assistência técnica ao produtor; articular com os planos nacionais o crédito rural administrado por entidades públicas ou privadas de âmbito nacional, estadual ou municipal; sugerir critérios para a localização de agências bancárias ou cooperativas que visem a operar no crédito rural e medidas tendentes à ampliação da rede distribuidora desses créditos; recomendar aos órgãos que operam no crédito rural a adoção de normas de organização e métodos de trabalho compatíveis com a política de crédito traçada pelo governo; estimular o treinamento de pessoal para a execução dos programas de crédito rural em articulação com as entidades atuantes nesses programas; promover o estudo da legislação em que se baseia o crédito rural e propor as modificações cabíveis, no sentido de assegurar a sua permanente adaptação às condições do meio e às exigências dos planos de financiamento do setor agrícola; administrar o Fundo de Crédito Rural, quando criado, propondo medidas para sua formação e incremento, assim como estabelecer os critérios de distribuição e controle de sua aplicação.

           O Gecre era composto pelos seguintes membros: ministro da Fazenda; ministro da Agricultura; diretor executivo da Superintendência da Moeda e do Crédito - SUMOC; presidente do Banco do Brasil; presidente do Banco Nacional de Crédito Cooperativo - BNCC; presidente do Banco do Nordeste; presidente do Banco da Amazônia; presidente da Associação Brasileira de Crédito, Assistência Técnica e Extensão Rural – ABCAR; presidente da Confederação Rural Brasileira; um representante dos bancos privados; um representante das cooperativas; diretor executivo do Gecre.

           Concomitantemente ao Decreto no. 50.637, o presidente Jânio Quadros aprovou as ”Diretrizes para a Política Nacional de Crédito Rural”, que continham definições mais tarde consagradas na legislação do crédito rural, a saber: crédito rural supervisionado – ação direta e intensiva, educacional, em articulação com os serviços de extensão rural , visando à família; crédito rural orientado – ação direta sobre a empresa rural, visando à melhoria dos níveis de produtividade e renda; crédito rural cooperativo – sistema de ação direta sobre as cooperativas e indireta sobre os seus membros. O documento estabelecia que a concessão do crédito rural, quando considerado instrumento essencial nos programas de aumento da produção e melhoria da produtividade rural, não visará predominantemente propósito lucrativo nem se subordinará às normas que regem as operações típicas de crédito bancário.

           Na sua outorga, o importante é suprir os produtores de recursos suficientes, no tempo oportuno e a prazos adequados às épocas previstas para a realização de suas rendas, assegurando-se, a par disso, retorno dos capitais emprestados e o ressarcimento dos custos operacionais. Os trabalhos do grupo exerceram profunda influência nas decisões que seriam adotadas a partir de então, inclusive na própria institucionalização do crédito rural, adotada pela Lei nº 4.829, de 5 de novembro de 1965.

           Em 1963, o presidente João Goulart enviou ao Congresso Nacional projeto de reforma bancária. O projeto criava uma Comissão Nacional de Crédito Rural, semelhante ao Gecre, composta pelos seguintes membros: o diretor executivo da Superintendência da Moeda e do Crédito - SUMOC; um diretor da Sumoc; um diretor da Carteira de Crédito Agrícola e Industrial - CREAI; um diretor da Carteira de Colonização; um diretor do Banco Nacional de Crédito Cooperativo - BNCC; um diretor do Banco do Nordeste; um diretor do Banco da Amazônia; um diretor da Superintendência de Política Agrária; um diretor da Superintendência Nacional de Abastecimento; um representante do Ministério da Agricultura.

           O país não conseguiu avançar nesse período e o projeto de reforma bancária só se transformou na Lei nº 4.595, de 31 de dezembro de 1964 no governo do presidente Castello Branco, porque o momento não era favorável, haja vista que, além dos índices de inflação serem altíssimos, outros fatores pesavam negativamente sobre o Mandatário da Nação. Mesmo assim, o presidente João Goulart procurou rever o conceito de desenvolvimento do presidente Juscelino. Sua política econômica incluía, entre as prioridades, a melhoria das condições sociais do país.

            Ganharam espaço as manifestações em defesa das reformas de base (agrária, tributária e educacional). O presidente João Goulart, no entanto, adotou medidas importantes que se refletiram no futuro da agricultura, quando reestruturou o Ministério da Agricultura, criou a Companhia Brasileira de Alimentos e a Superintendência Nacional de Abastecimento, ampliou a atuação da Comissão de Financiamento da Produção e autorizou a Sunab a constituir a CIBRAZÉM – Companhia Brasileira de Armazenamento.

quinta-feira, 24 de outubro de 2013

O AGRONEGÓCIO BRASILEIRO: surgimento, evolução e perspectivas

"Obrigado ao homem do campo Do oeste, do norte e do sul Sertanejo da pele queimada Do sol que brilha no céu azul Sertanejo da pele queimada Do sol que brilha no céu azul E obrigado ao homem do campo Que deu a vida pelo Brasil Seus atletas, heróis e soldados Que a santa terra já cobriu" (Dom e Ravel)
O Brasil, apesar das suas imensas reservas naturais com grande capacidade de exploração que lhe permite não só a sua autossustentabilidade, mas também o de suprir as necessidades de outros povos, não tem conseguido tirar proveito em grande escala de toda a sua potencialidade. No entanto, entre avanços e recuos, passos importantes têm sido dados. Embora de forma gradual, vai pouco a pouco superando os desafios e colocando-se num patamar de destaque em nível mundial. Através da análise, fica constatado que essa realidade não poderia se apresentar diferentemente, haja vista a herança cultural resultante de um povo marginalizado e submisso a uma pequena minoria detentora do poder e das terras. Grandes latifúndios, às vezes improdutivos, representavam o poder e o ‘‘status” de poucos, constituindo-se num grande desafio aos governos no que se refere à utilização adequada da terra para gerar uma maior produção e, consequentemente, maiores divisas para o país. Outro aspecto que merece ser ressaltado é a falta de infraestrutura, no período anterior aos Governos Militares , tais como ausência de estradas que interligassem as regiões, disparidades regionais, carência de transportes, armazéns, profissionais habilitados, dentre outras. A partir do segundo governo de Vargas (1951-1954), constataram-se alguns direcionamentos importantes, como abertura de estradas; criação de instrumentos de apoio à atividade rural (preços mínimos, armazenamento, crédito, assistência técnica e extensão rural); instalações de montadoras de automóveis, de fábricas de tratores, de colheitadeiras, de inseticidas e de fertilizantes, que foram estruturando o país, favorecendo a modernização da atividade rural, tendo como consequência a expansão da área plantada, o aumento da produtividade e da produção e o seu escoamento. Os movimentos sociais, que se intensificaram mais precisamente na década de cinquenta com as ligas camponesas, tiveram muita importância nas políticas de governos, e foi a partir deles que o lavrador começou a ter consciência do seu papel na sociedade e passou a pressionar os governantes por melhores condições de vida e de trabalho, resultando em conquistas diversas, como a criação da Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste - SUDENE, o Estatuto da Terra, a institucionalização do crédito rural, o Programa de Assistência (PRORURAL) e a legislação trabalhista para o Trabalhador Rural. A Lei nº 4.504, de 30 de novembro de 1964, conhecida como o Estatuto da Terra, ainda em vigor, teve o seu projeto enviado ao Congresso Nacional, por pressão dos movimentos sociais, no governo de Goulart, transformando-se em Lei somente no governo do presidente Castelo Branco. Essa Lei acendeu a esperança dos trabalhadores rurais sem terra, porque representou um grande avanço na legislação agrária brasileira, quando regulamentou as questões de Reforma Agrária no título II e as de Política Agrícola no título III. Afirma no art. 2º. que “É assegurada a todos a oportunidade de acesso à propriedade da terra condicionada pela sua função social, na forma prevista nesta Lei”. Define o que é imóvel rural, propriedade familiar, latifúndio, módulo rural, parâmetros para que se saiba quando a terra desempenha a sua função social e as atribuições do Poder Público. A Política Agrícola dos governos militares, comparada à dos governantes que os antecederam, apesar de algumas deficiências e muitos desacertos, avançou consideravelmente, propiciando condições para a modernização da atividade rural brasileira, com incentivos aos produtores rurais, como facilidades de acesso a crédito e outros instrumentos de apoio, como preços mínimos, armazenamento e transporte, seguro agrícola e assistência técnica e extensão rural. Avançou também no que diz respeito a outras questões sociais, quando assegurou aos trabalhadores rurais um Programa de Assistência e uma legislação trabalhista própria para a categoria. Esses direitos são de uma relevância incontestável, pois, sem eles, a grande maioria dos trabalhadores rurais não teria como ter uma velhice digna. A atividade rural no Brasil vem despontando como altamente promissora e o desenvolvimento do agronegócio acompanhou o crescimento da produção de grãos, iniciada em larga escala a partir de meados da década de setenta. Até então a economia
agrícola brasileira era caracterizada pelo predomínio do café e do açúcar. A produção de alimentos básicos, como milho, arroz e feijão, era voltada para a subsistência, e os poucos excedentes dirigidos ao mercado eram insuficientes para formar uma forte cadeia do agronegócio dentro dos moldes hoje conhecidos. O crescimento da produção de grãos, principalmente da soja, logo foi sentido no processo de transformação do agronegócio brasileiro e seus efeitos dinâmicos logo se manifestaram em toda a economia. Em princípio, surgiu um enorme parque industrial para a extração do óleo e do farelo da soja e outros grãos. A disponibilidade de grande quantidade de farelo de soja e milho permitiu o desenvolvimento de uma moderna e sofisticada estrutura para a produção de suínos, aves e leite, bem como a instalação de grandes frigoríficos e fábricas para a sua industrialização.
É verdade, no entanto, que sobreveio, após o regime militar, uma grande crise na atividade rural brasileira, tendo como consequências o endividamento dos produtores rurais e dificuldades financeiras para os bancos, especialmente o Banco do Brasil, que necessitou de aporte de capital do governo federal, na gestão de Fernando Henrique Cardoso, sob pena de não ter como sobreviver. Por outro lado, há que se ter em mente que a superação da crise se verificou mais facilmente em função da infraestrutura do país e dos produtores assegurada no regime militar. Como resultado, o Brasil produz hoje como nunca, tendo como estimativa para a safra 2008/2009, cerca de 145 milhões de toneladas de grãos. Concluindo, a atividade rural no Brasil recebeu na década de setenta um incentivo nunca registrado, pois o governo ofereceu a infraestrutura necessária para que efetivamente o crédito rural fosse até o produtor através da vasta rede de agências do Banco do Brasil e de outros Bancos Federais e deu assistência técnica e extensão rural, através dos órgãos estatais, além de suporte com garantia de preços mínimos, armazenamento e seguro rural. Na década de setenta, criou-se ainda a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária -EMBRAPA, responsável por um papel relevante na atividade rural brasileira, tendo em vista o seu trabalho de pesquisa, indispensável para o desenvolvimento de novas variedades de culturas e para a melhoria genética de plantas e do rebanho, fatores fundamentais para o salto qualitativo alcançado nos dias atuais pelo setor produtivo. O que se lamenta ainda é o desnível entre o que se direciona para a agricultura familiar e o que se canaliza para a empresarial e de exportação. Este ano, algo em torno de apenas 15% da dotação orçamentária da agricultura estão sendo aplicados na agricultura familiar. Essa relação de prioridade precisa mudar, pois não é mais admissível se conviver com a fome no país, e um dos caminhos para se superar essa questão é incentivar a lavoura de subsistência. O Brasil ocupa atualmente uma posição de destaque no mundo como produtor rural e pode-se afirmar com muita segurança e propriedade que na atividade rural reside a solução para muitos dos problemas brasileiros. O país ainda tem um grande potencial produtivo para explorar, tendo em vista que dispõe de muita terra para cultivar e tem capacidade para aumentar substancialmente o rendimento das áreas atualmente plantadas, por meio de pesquisas, com melhoramento genético das lavouras, dos rebanhos de animais e pela mecanização do plantio, dos tratos culturais e da colheita. Ainda que se tenha avançado em termos de crescimento no tocante às questões rurais, muitos desafios ainda estão a exigir soluções, tais como: melhor distribuição de terras, intensificando os assentamentos previstos como meta pelo governo atual; desenvolvimento de uma competência técnica e tecnológica compatível com as exigências do mundo globalizado àqueles que precisam do suporte governamental, a fim de que possam competir em nível de igualdade com os grandes produtores rurais. Para se manter o homem no campo com trabalho e dignidade, é indispensável uma política pública que conjugue o crédito com assistência técnica e educação voltada para uma boa conscientização do lavrador, sem perder de vista os instrumentos de apoio à atividade rural, como preços mínimos, seguro rural, transporte e armazenamento, além de uma política consistente de redistribuição de terra.

sábado, 19 de outubro de 2013

AGRONEGÓCIO. A ÚLTIMA GRANDE CRISE QUE ABALOU PROFUNDAMENTE

"Obrigado ao homem do campo Pelo leite o café e o pão Deus abençoe os braços que fazem O suado cultivo do chão Obrigado ao homem do campo Pela carne, o arroz e feijão Os legumes, verduras e frutas E as ervas do nosso sertão" (Dom e Ravel)
            Nos primeiros anos da década de oitenta, ainda no governo do presidente Figueiredo, a economia brasileira começou a enfrentar sérias dificuldades. A crise que se abateu sobre o país afetou em cheio os produtores rurais, que passaram a contar com menos crédito e em condições menos favoráveis. A crise atingiu o seu ápice somente no governo do presidente Sarney, quando o produtor rural foi muito penalizado. Na ocasião, as suas dívidas, além de serem acrescidas de juros, eram atualizadas pela correção monetária, índice que superava o de valorização dos produtos agropecuários, que eram contidos pelas autoridades do governo como forma de evitar a inflação.

             Naquele período houve também muita escassez de recursos para a atividade rural. Os governos dos presidentes Sarney, Collor de Melo e Itamar Franco foram de poucas realizações no tocante à atividade rural. Nenhum deles, no entanto, prejudicou tanto o produtor rural quanto o presidente Collor, que extinguiu órgãos importantes para a implementação da política agrícola, cortou recursos para o setor e promoveu a abertura da economia, contribuindo para o empobrecimento e desestímulo de produtores. A sua política refletiu negativamente no Banco do Brasil, que resistindo dos problemas passados, necessitou de aporte de recursos no governo de Fernando Henrique Cardoso, sob pena de falir.

           O presidente Collor foi o primeiro civil eleito pelo povo depois de Jânio Quadros e após uma ditadura militar que durou mais de vinte anos. Destacou-se pela sua juventude, pela empolgação, pelo discurso de modernidade e pela promessa de combate à corrupção. Segundo Vicentino (1999, p.447): "Uma das palavras mais utilizadas por Collor desde a campanha eleitoral era ‘moderno’. Prometia modernizar o Brasil, e sua própria figura jovem, bem como a de alguns de seus ministros, forneciam um suporte a esse tipo de discurso. Por modernização, Collor entendia a diminuição do papel do Estado, o que incluía a defesa do livre mercado, a abertura para as importações, o fim dos subsídios e as privatizações. Em suma, uma adequação do Brasil à nova realidade do neoliberalismo mundial."

            O presidente Collor assumiu a direção do país em um momento extremamente delicado, quando a inflação atingiu um índice de 84% ao mês. Por esta razão adotou medidas radicais para debelar o processo inflacionário, congelando ativos financeiros de clientes nos bancos, extinguindo empresas estatais e ministérios, tabelando preços, demitindo funcionários e abrindo a economia. No tocante à política agrícola, o governo Collor representou um grande retrocesso, pois o Banco do Brasil, o maior aliado do produtor rural, teve o volume de recursos aportado pelo Tesouro ao crédito agrícola cada vez mais reduzido, em vista das restrições fiscais, representando, em 1991, apenas 17% do total previsto. O banco enfrentou sérias dificuldades, pois aplicou no crédito rural um volume de recursos superior ao disponível nas fontes, com o desvio de recursos destinados a outras atividades ou mesmo à captação adicional no mercado, a custos mais elevados. O governo Collor foi marcado por muitos problemas, questão que é objeto de apreciação importante por Silva (1999, p.79): "O início dos anos 90 foi profundamente marcado pelo ‘desmanche’ dos instrumentos de política agrícola (garantia de preços mínimos, estoques reguladores, redução do crédito agropecuário) promovido pelo governo Collor, juntamente com a significativa queda nos recursos (gastos) públicos destinados à agricultura (infra-estrutura, pesquisa agropecuária, assistência técnica, etc.). Além disso, houve uma abrupta abertura comercial, que trouxe sérios problemas para a agricultura nacional, na maioria das vezes impossibilitada de competir com produtos internacionais fortemente subsidiados nos seus países de origem. Além disso, a necessidade de controle da inflação tendeu a depreciar os preços mínimos, ao passo que os altos juros reais, típicos dos sucessivos planos econômicos, aumentavam bem mais os custos dos financiamentos, gerando descompassos que tiveram sérias repercussões nas atividades do banco."

            Houve um comprometimento da saúde financeira do Banco do Brasil e de muitos produtores manifestado nos anos seguintes, obrigando o presidente Fernando Henrique Cardoso a fazer um aumento no capital social do banco e securitizar as dívidas rurais, como forma de evitar a quebra do Banco e de muitos produtores. No governo do presidente Itamar não se fez muito em prol da agricultura, mas naquele período o país teve um pouco mais de tranqüilidade, porque além do apoio obtido no Congresso Nacional, a situação econômica dava alguns sinais de melhoria. Não no que se refere à inflação – que continuava escapando do controle – mas principalmente na questão da dívida externa. A economia voltou a crescer, atingindo, em 1994, uma taxa de quase 5%, o melhor resultado desde o início dos anos oitenta, excetuando-se 1986, o ano do plano Cruzado. O governo tinha necessidade de continuar priorizando o combate à inflação e um dos instrumentos utilizados foi a chamada ‘‘âncora verde”, que consistia em manter o câmbio defasado e acentuar os efeitos das importações, empurrando para baixo os preços internos, prejudicando, em contrapartida, os produtores brasileiros. O Banco do Brasil se ressentiu dos efeitos da política desastrosa do governo Collor e continuou sendo prejudicado, pois com os preços mínimos depreciados e as taxas de juros se mantendo altas, aumentavam os custos dos financiamentos, gerando descompassos, o que resultou em um volume excessivo de inadimplência com graves conseqüências para a saúde financeira da instituição.

            A recuperação dos negócios do campo começou ainda no governo do Presidente Itamar, que teve sensibilidade suficiente para com o setor e buscou maneiras para ajudá-lo a sair da crise. O governo do presidente Itamar Franco foi sensível às questões relativas aos pequenos agricultores, por isso que, atendendo reivindicações dos trabalhadores rurais e com base em estudos realizados conjuntamente pela Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação - FAO e o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária - INCRA, que definem com maior precisão conceitual a agricultura familiar e, ainda, estabelecem um conjunto de diretrizes que deveriam nortear a formulação de políticas para esse segmento específico, criou o Programa de Valorização da Pequena Produção Rural (PROVAP), que visava a financiar a agricultura familiar com condições mais acessíveis. O PROVAP passou por modificações e deu origem ao Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF), que hoje é um valioso instrumento de apoio à pequena agricultura. Sobre esse assunto, comenta Mattei (2002, p.02): "Porém, institucionalmente houve uma série de modificações até que o Programa atingisse o formato atual. Cronologicamente, nota-se que esse programa de mudanças na política agrícola teve início em 1994, quando o Governo Itamar criou o Programa de Valorização da Pequena Produção Rural (PROVAP), cujo objetivo era destinar um volume de crédito com taxas de juros mais acessíveis aos agricultores familiares."

            Em 1994, quando foi criado o PROVAP, a agricultura familiar atravessava uma fase crítica, visto que naquela ocasião, além da escassez de recursos para esse segmento, não se fazia praticamente distinção entre o grande e o pequeno produtor em termos de condições. Ambos recebiam tratamentos idênticos no tocante aos prazos e às taxas de juros, salvo nas Regiões Centro-Oeste, Nordeste e Norte, que dispunham de recursos do Fundo Constitucional. No governo do presidente Fernando Henrique Cardoso, algumas medidas importantes foram adotadas, como o fortalecimento do Banco do Brasil e do Programa Nacional de Agricultura Familiar, o que se reverteu em alento e incentivo aos produtores. No seu governo, fez-se ainda a securitização e o alongamento das dívidas agrícolas. O presidente Lula continua mantendo o que foi feito no governo anterior e ainda tem usado outros instrumentos de política agrícola que estão se traduzindo em resultados concretos. Com a estabilidade da economia e a abertura do mercado, teve o produtor que se adaptar às novas exigências do mundo globalizado, por isso passou a desenvolver a atividade rural de forma mais profissional, preocupando-se com redução de custos e ganhos de produtividade, de modo a ter maior poder de competitividade. O crédito rural oficial foi reformulado para estimular uma participação maior do setor privado. As dívidas anteriores foram securitizadas e a estrutura governamental de apoio à comercialização passou por profundas mudanças com a criação de instrumentos mais modernos e menos intervencionistas. Na pesquisa agropecuária, foram adotadas várias medidas para torná-las mais afinadas com o mercado e mais objetivas, porque o crédito rural não era mais abundante como antes e porque não existia mais subsídio. Os recursos passaram a ser mais bem aplicados, o que assegurou o crescimento da produção e a melhoria a cada ano dos índices de produtividade, fazendo da atividade rural brasileira uma das mais prósperas do mundo.

            O governo do presidente Fernando Henrique Cardoso teve o mérito de reformular o PROVAP e transformá-lo no PRONAF global, que se firmou como a principal política pública de apoio aos agricultores familiares. Sobre essas mudanças e a importância do programa, argumenta Mattei (2002, p.03): "No ano seguinte (1995), já no Governo Fernando Henrique Cardoso, o PROVAP foi totalmente reformulado, tanto em termos de concepção como em sua área de abrangência. Essas modificações deram origem, em 1996, ao PRONAF global. Desse ano em diante, o programa tem se firmado como a principal política pública de apoio aos agricultores familiares. Deve-se registrar, ainda, dois fatos importantes: primeiro, em 1995 apenas as ações relativas ao crédito de custeio foram implementadas. Segundo, a ampliação do programa para as áreas de infra-estrutura e de capacitação só ocorreu a partir de 1996, quando o PRONAF ganhou maior dimensão e passou a operar nacionalmente."

            A reformulação desse programa é, sem dúvida, uma grande realização do Presidente Fernando Henrique Cardoso, cujo objetivo geral é propiciar condições para aumentar a capacidade produtiva, a geração de emprego e de renda, de tal forma a melhorar a qualidade de vida dos agricultores familiares. Para isso, foram definidos como objetivos específicos: ajustar as políticas públicas de acordo com a realidade dos agricultores familiares; viabilizar a infra-estrutura necessária à melhoria do desempenho produtivo dos agricultores familiares; elevar o nível de profissionalização dos agricultores familiares através do acesso aos novos padrões de tecnologia e de gestão social; estimular o acesso desses agricultores aos mercados de insumos e produtos. O programa vem sendo muito bem aceito pelos agricultores familiares, por isso há, para 2005, uma previsão de aplicação de recursos no segmento em torno de sete bilhões de reais.

           O governo do presidente Lula mantém os instrumentos de política agrícola do governo passado e, não só isso, é preocupado com a questão dos pequenos produtores rurais, pois com as Leis nº 10.696, de 2 de julho de 2003, e nº 10.823, de 19 de dezembro de 2003, fez um verdadeiro saneamento das dívidas dos agropecuaristas das Regiões Centro-Oeste, Norte e Nordeste do país, que haviam se beneficiados em anos anteriores de recursos do Fundo Constitucional e não estavam conseguindo pagar suas dívidas. As medidas determinadas tanto facilitaram em termo de elastecimento de prazos para pagamento quanto com reduções que chegaram até 80% (oitenta por cento) do saldo devedor para aqueles que se dispusessem a quitar de imediato os seus débitos. O governo vem conquistando espaços no comércio internacional e, com isso, tem estimulado os grandes produtores que exploram atividades rurais voltadas para o mercado externo. Venceu duas ações históricas junto à Organização Mundial do Comércio - OMC, que aumentaram a pressão sobre a Europa e os Estados Unidos para eliminarem seus subsídios agrícolas. Segundo Celso Amorim, ministro das Relações Exteriores do Brasil: ‘‘há uma nova consciência própria que não existia antes. O Brasil estava na época em uma posição frágil e as condições não eram oportunas para o Brasil exercer um papel maior’’. Ele se referia ao tempo em que também ocupou o mesmo cargo. Em outra entrevista no Itamarati, em 2004, falando sobre a decisão da OMC, afirmou: ‘‘Agora nós temos um selo de qualidade: uma política econômica crível e política estável”.

            O atual governo tem mostrado sinais convincentes de que a atividade rural é uma das suas principais prioridades, fato que se confirma pelas diversas ações implementadas, destacando-se o enfoque dado ao financiamento da agricultura familiar. Tecendo comentários sobre o Ministro do Desenvolvimento Agrário, noticia o Jornal O Povo (2004, p.26): "Segundo ele, um milhão de agricultores recebem a linha de financiamento para custeio, dentro do Programa Nacional de Fortalecimento da agricultura Familiar (Pronaf), com uma taxa de inadimplência de apenas 2%. Este ano, serão investidos R$ 5,8 bilhões em agricultura familiar. Rossetto informa ainda que os recursos destinados para a compra da produção de agricultores familiares para o Programa Fome Zero irão saltar de R$ 180 milhões, este ano, para mais de R$ 300 milhões em 2005."

            O Programa Nacional do Álcool (PROÁLCOOL), que por razões diversas havia sido abandonado, está sendo reativado com excelentes perspectivas de sucesso. Existem algumas dificuldades a serem superadas pelo governo, pois a malha rodoviária, além de ainda ser relativamente pequena em relação à dimensão territorial, a atual depende de grandes investimentos para a sua recuperação. A malha ferroviária, que poderia ser uma boa alternativa para o transporte da produção, é diminuta e os portos, por onde passa toda a exportação do país, não oferecem as adequadas condições de uso. Tudo isso, como se verifica, são fatores que enfraquecem o poder de competitividade do Brasil no mercado internacional.

            O governo, no entanto, já aprovou no Congresso Nacional o plano de Parceria Público-Privada, uma alternativa para o equacionamento de questões importantes relativas à infra-estrutura do País, como bem se conclui da matéria disponibilizada no site da Com Ciência – Transporte (2005, p.03): "O governo federal já busca o apoio da iniciativa privada para solucionar a ineficiência do sistema de transportes no Brasil. O plano de Parceria Público-Privada pretende investir R$ 13,68 bilhões em 23 projetos de reformas em rodovias, ferrovias, portos e canais de irrigação até 2007. Segundo Marisa Regitano d’ Arce, professora do departamento de Agroindústria, Alimentos e Nutrição da Esalq/USP, ‘é necessário que os diversos setores da cadeia produtiva ajam de forma integrada, desde a origem até as unidades armazenadoras, recepção no porto e operações de frete de retorno, que reduz o custo do transporte’."

            Como se verifica, apesar de muito grave o problema de infra-estrutura, vislumbra-se uma perspectiva de solução. Há, pelo menos, uma clara intenção do governo de equacionar essa questão, porque, como se sabe, é um grande entrave para o comércio internacional, do qual o país é extremamente dependente.

sábado, 12 de outubro de 2013

AGRONEGÓCIO SURGIU E EVOLUIU GRAÇAS AO CRÉDITO DOS BANCOS PÚBLICOS

Os Bancos Federais foram preponderantes para a política agrícola dos governos militares, especialmente o Banco do Brasil que, em 1970, segundo informações encontradas em seu site, possuía pouco mais de quinhentas unidades em funcionamento no país, tendo atingido, no final do governo do presidente Figueiredo, mais de três mil unidades, por isso se fez presente em cerca de cinqüenta por cento dos municípios brasileiros, proporcionando ao produtor rural todo o apoio possível para que ele preparasse a terra, plantasse, colhesse e comercializasse a sua safra. A expansão do Banco do Brasil foi um reflexo do que aconteceu com a atividade rural, pois como o Governo canalizava somas gigantescas de dinheiro para o homem do campo, o povo cobrava a presença de um agente financeiro em seu município para disseminar o crédito e, por isso, frequentemente eram abertas agências do banco em todos os recantos do país. A instalação de uma agência do Banco do Brasil em uma cidade do interior era tida como sinal de prosperidade. A data da inauguração da agência era comemorada com muita festa pela comunidade. “A lua de mel” entre esta e os funcionários daquela se estendia por muito tempo. O Banco do Brasil, através de sua vasta rede de agências espalhadas por quase todos os recantos do País, foi vital para o propósito do Governo de oferecer crédito ao maior número possível de agricultores. O Banco, como esteve durante todo o Regime Militar de braços dados com o homem do campo, diga-se, os donos de terras, consolidou uma imagem altamente positiva junto à sociedade, tanto que o seu funcionário, mesmo não tendo um salário tão significativo, era muito bem visto pelas comunidades e sempre tido como uma pessoa de destaque onde morava. Para que se tenha uma nítida noção do que ocorreu com o Banco do Brasil na década de setenta, basta que se mostre que o número de seus servidores, segundo informações encontradas em seu site, pulou de 65 mil no final de 1975, para 118 mil em dezembro 1980. Esse crescimento percentual ultrapassa cento e oitenta e um por cento em um curto período de cinco anos. Não há o que se questionar quanto à importância do Banco do Brasil como agente do Governo Federal, pois foi por meio dele que o crédito chegou às mãos dos mais diversos segmentos de produtores que habitavam os mais distantes povoados e sítios do país, tendo em vista que onde quer que se imagine, lá está o Banco instalado e atuando ao lado do trabalhador rural. Não teria como se pensar em uma missão tão arrojada sem a presença de uma Instituição tão sólida e confiável como o Banco do Brasil, que ainda hoje se constitui em agente financeiro do Governo Federal, e principal parceiro do homem do campo. A década de setenta é um marco na história da agropecuária brasileira, época em que houve efetivamente o nascimento das grandes fronteiras agrícolas que aí estão e que puseram o país na posição de destaque que ostenta a partir da virada do século. De acordo com matéria publicada no site do Ministério da Agricultura, é o Brasil atualmente o segundo do mundo na produção de soja e o primeiro na de café, de suco de laranja e de cana-de-açúcar, despontando como país de atividade rural altamente desenvolvida, capaz de competir no mercado externo com as principais potências do planeta. O Banco do Brasil não tem sido importante apenas como agente financiador da atividade rural; ele tem sido vital para o desenvolvimento de outras atividades relacionadas com o campo, como, por exemplo, as indústrias de máquinas agrícolas, de fertilizantes e inseticidas, bem como as indústrias de produtos derivados da agropecuária, como usinas de álcool e açúcar, de laticínio e de óleos vegetais. O Banco passou por grandes transformações na década de oitenta, com a perda da conta movimento, e na década de noventa, quando teve de se adaptar a uma nova conjuntura econômica. O Plano Collor causou sérios transtornos no sistema financeiro, quando confiscou o ativo de clientes nos bancos e restringiu os repasses de recursos para financiamento das atividades produtivas. Posteriormente, teve o Banco que conviver com a nova realidade imposta pelo Plano Real.2 Com a extinção da Conta-Movimento, o Banco do Brasil foi autorizado a operar em todos os segmentos de mercado. Inicia-se, assim, a transformação do Banco em conglomerado financeiro. O perfil do Banco do Brasil sofreu transformações e, para continuar aplicando na agricultura, teve que conseguir a chamada “Poupança Verde”, cuja captação se destinava ao campo. A criação dessa poupança, embora tenha gerado uma fonte de recurso para o setor rural, afetou o setor habitacional do País, tendo em vista que a poupança, que até aquele momento se destinava exclusivamente ao financiamento de moradia, passou a financiar também a atividade rural. Sobre os problemas que afetaram o desempenho do Banco do Brasil, comenta Vidotto (2004, p.04): "O BB, por sua vez, já havia atravessado o ano de 1989 carregando um descasamento relativo ao sistema de crédito rural da ordem de US$ 1 bilhão, também decorrente da mudança de indexadores associada neste caso ao Plano Verão. No ano seguinte, a queda na renda agropecuária verificada com o Plano Collor serviu para tensionar a relação entre o banco e essa parte de sua tradicional clientela devido a dificuldades para o banco reaver recursos emprestados. Além disso, a adoção da Taxa Referencial (TR), criada em 1991, com o Plano Collor II, aumentou ainda mais esse distanciamento por ser, na ótica dos produtores, inadequada para as especificidades." 2 Os bancos lucravam muito com a inflação, pois captavam depósito à vista a custo zero e aplicavam em títulos do governo que ofereciam alta lucratividade. Com a brusca queda da inflação ocasionada pelo Plano Real implantado em junho/julho/1994, tiveram que mudar as estratégias de negócios para se adaptarem à nova conjuntura econômica. do crédito rural. Nasceu daí outro contencioso que iria detonar a crise em 1995, como será visto adiante. O Banco da Amazônia e o Banco do Nordeste, que têm no produtor rural a sua principal clientela, conviveram também com os mesmos problemas enfrentados pelo Banco do Brasil.

domingo, 6 de outubro de 2013

ADVOCACIA EM ALERTA: A LEI DA AÇÃO POPULAR É UM BOM INSTRUMENTO DE CONTROLE DA GESTÃO PÚBLICA

           "Porque não há justiça no mundo Não há justiça no mundo Não acredito em justiça Deus é mau, Deus é mau, Deus é mau Estou cansado de sonhar em vão De lutar em vão Só resta pedir a Deus mau Compaixão Se ajoelhar e pedir perdão Perdão pelo mal que fizemos a outras pessoas Em outras encarnações Cazuza)
           A Lei nº. 4.717, de 29 de junho de 1965, recepcionada pela Constituição Federal de 1988, é um ótimo instrumento de controle da gestão pública posta a disposição de todos os cidadãos para que façam valer os direitos de todos, uma vez comprovando-se a existência do binômio ilegalidade e lesividade praticada por agente público. Vejamos o que dispõe o art.1º. da Lei da Ação Popular: “Art. 1º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios, de entidades autárquicas, de sociedades de economia mista (Constituição, art. 141, § 38), de sociedades mútuas de seguro nas quais a União represente os segurados ausentes, de empresas públicas, de serviços sociais autônomos, de instituições ou fundações para cuja criação ou custeio o tesouro público haja concorrido ou concorra com mais de cinqüenta por cento do patrimônio ou da receita ânua, de empresas incorporadas ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados e dos Municípios, e de quaisquer pessoas jurídicas ou entidades subvencionadas pelos cofres públicos”.

           A Constituição Federal, por sua vez, define no art. 5º., inciso LXXIII: “Qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência.”

           Como todos podem ver, o combate à corrupção não é tarefa exclusiva da Polícia e do Ministério Público. Todos nós cidadãos podemos e devemos fazer uso dos mecanismos legais postas a nossa disposição para também exercermos os nossos direitos nesse particular. Hely Lopes Meireles, com a autoridade que lhe é peculiar, conceitua a ação popular da seguinte forma: “É o meio constitucional posto à disposição de qualquer cidadão para obter a invalidação de atos ou contratos administrativos – ou a estes equiparados – ilegais e lesivos do patrimônio federal, estadual e municipal, ou de suas autarquias, entidades paraestatais e pessoas jurídicas subvencionadas com dinheiros públicos”.

           A ação popular visa combater o ato ilegal ou imoral, lesivo ao patrimônio público, sem configurar a ultima ratio, ou seja, não se exige o esgotamento de todos os meios administrativos. Vale lembrar que Noberto Bobbio, do alto da sua grandeza, ressaltou que “Os direitos do homem (...) são direitos históricos, ou seja, nascidos em certas circunstâncias, caracterizados por lutas em defesa de novas liberdades contra velhos poderes, e nascidos de modo gradual, não todos de uma vez e nem de vez por todas. (...) Nascem quando devem ou podem nascer.”

           Desse modo, se queremos progredir como sociedade e cidadãos, resta-nos estarmos sempre atentos e agirmos com determinação e coragem para que tenhamos respeitados os nossos direitos. José dos Santos Carvalho Filho, no seu Manual de Direito Administrativo, 23ª Ed., Rio de Janeiro: Lumen, 2010, p. 1.143, esclarece que ”Ação Popular é a garantia de nível constitucional que visa à proteção do patrimônio público, da moralidade administrativa e do meio ambiente.” É de fato um valioso instrumento de controle administrativo posto a disposição de todos os cidadãos.

           Como bem afirma Maria Tereza Queiroz Carvalho, em artigo publicado no JurisWay, “A Soberania Popular pode ser entendida como a supremacia da vontade do povo, fazendo com que o Estado necessite do consentimento da população (governados) para tomar decisões.” E isso é fato. A Constituição brasileira de 1988 estabelece no parágrafo único do art. 1º: que “Todo poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”; assim como o art. 23 do “Pacto São José da Costa Rica”: Todos os cidadãos devem gozar dos seguintes direitos e oportunidades: a) a de participar da direção dos assuntos públicos, diretamente ou por meio de representantes livremente eleitos.

           Por sua vez, o art. 14 da Constituição de 1988 é claro ao afirmar as formas de se exercer a soberania popular, quais sejam: sufrágio universal (voto nas eleições regulares), plebiscito, referendo e iniciativa popular (Lei de iniciativa popular). Para além do citado art. 14 e da Lei 9.709/98 que regulamenta essas formas de se exercer a soberania popular, é perfeitamente compreensível que a Constituição nos dá outros instrumentos de defesa e participação social, como ocorre em relação à Ação Popular (art. 5º, LXXIII e Lei 4.717/65), e à Ação Civil Pública (Lei 7.347/85) ao trazer proteção aos direitos coletivos e difusos.

           Cabe Ação Popular contra toda ação ou omissão lesiva ao patrimônio público brasileiro. Além dos bens materiais estatais, cabível será a Ação Popular na proteção da moralidade administrativa, do meio ambiente e dos bens históricos e culturais. Nos termos do art. 2º da Lei da Ação Popular, podem ser atacados judicialmente os atos lesivos ao patrimônio público nos casos de incompetência, vício de forma, ilegalidade do objeto, inexistência dos motivos e desvio de finalidade.

           Reportando-se a Lei da Ação Popular aos conceitos nas hipóteses passíveis de nulidade dos atos lesivos ao patrimônio público, temos: "a) a incompetência fica caracterizada quando o ato não se incluir nas atribuições legais do agente que o praticou; b) o vício de forma consiste na omissão ou na observância incompleta ou irregular de formalidades indispensáveis à existência ou seriedade do ato; c) a ilegalidade objeto ocorre quando o resultado do ato importa em violação de lei, regulamento ou outro ato normativo; d) a inexistência dos motivos se verifica quando a matéria de fato ou de direito, em que se fundamentou o ato, é materialmente inexistente ou juridicamente inadequada ao resultado obtido; e) o desvio de finalidade se verifica quando o agente pratica o ato visando a fim diverso daquele previsto, explícita ou implicitamente, na regra de competência" (parágrafo único, art. 2º).

           Já o art. 3º da Lei da Ação Popular enuncia que os atos lesivos cujos vícios não se compreendam no elenco do art. 2º serão anuláveis, segundo as prescrições legais compatíveis com a natureza deles. No art. 4º há um outro catálogo de atos passíveis de anulação via Ação Popular, que não estão aludidos no rol do art. 2º., que especifica algumas situações de modo mais pormenorizado, mas dentro dos parâmetros já estabelecidos, posto que a tônica para a nulidade é o caráter lesivo e ilegal do ato objurgado judicialmente. Desse modo, será cabível, a Ação Popular toda vez que houver ação ou omissão ilegítima e lesiva ao patrimônio público, independentemente de quem seja a autoria do ato.

           Considerando que a presente matéria não tem cunho doutrinador, entendemos por bem não nos alongar em questões procedimentais da Ação Popular, como competência para processá-la e julgá-la, legitimidade ativa e passiva, procedimento e pressupostos, dentre outros. Com esse pequeno artigo tivemos como propósito tão somente chamar a atenção dos leitores para a existência de mais esse instrumento de controle, que pode ser usado como arma de combater da ilegalidade e da lesividade do patrimônio público, sem prejuízo de outros meios disponíveis para o efetivo combate à corrupção, vitais para a moralidade da máquina do Estado.

sábado, 5 de outubro de 2013

O AGRONEGÓCIO VERSUS A AGRICULTURA FAMILIAR

           "Obrigado ao homem do campo Que ainda guarda com zelo a raiz Da cultura, da fé, dos costumes E valores do nosso país Obrigado ao homem do campo Pela semeadura do chão E pela conservação do folclore Empunhando a viola na mão E pela conservação do folclore Empunhando a viola na mão" (Dom e Ravel)
A atividade rural no Brasil vem despontando como altamente promissora e o desenvolvimento do agronegócio acompanhou o crescimento da produção de grãos, iniciada em larga escala a partir de meados da década de setenta.

Até então a economia agrícola brasileira era caracterizada pelo predomínio do café e do açúcar. A produção de alimentos básicos, como milho, arroz e feijão, era voltada para a subsistência, e os poucos excedentes dirigidos ao mercado eram insuficientes para formar uma forte cadeia do agronegócio dentro dos moldes hoje conhecidos.

           O crescimento da produção de grãos, principalmente da soja, logo foi sentido no processo de transformação do agronegócio brasileiro e seus efeitos dinâmicos logo se manifestaram em toda a economia. Em princípio, surgiu um enorme parque industrial para a extração do óleo e do farelo da soja e outros grãos. A disponibilidade de grande quantidade de farelo de soja e milho permitiu o desenvolvimento de uma moderna e sofisticada estrutura para a produção de suínos, aves e leite, bem como a instalação de grandes frigoríficos e fábricas para a sua industrialização.

           Os conhecimentos aqui explicitados são ratificados pelo Ministério da Agricultura, que, em artigo disponibilizado na internet (2004, p.01), assim se posiciona: "Moderno, eficiente e competitivo, o agronegócio brasileiro é uma atividade próspera, segura e rentável. Com um clima diversificado, chuvas regulares, energia solar abundante e quase 13% de toda a água doce disponível no planeta, o Brasil tem 388 milhões de hectares de terras agricultáveis férteis e de alta produtividade, das quais 90 milhões ainda não foram explorados. Esses fatores fazem do país um lugar de vocação natural para a agropecuária e todos os negócios relacionados à suas cadeias produtivas. O agronegócio é hoje a principal locomotiva da economia brasileira e responde por um em cada três reais gerados no país."

           O avanço na produção fomentou também as indústrias de fertilizantes, defensivos, maquinários agrícolas, e com isso surgiu uma grande rede de distribuição, que inclui desde as grandes cadeias de supermercados até os pequenos varejistas locais. O agronegócio ganhou fôlego com a política agrícola adotada pelos militares na década de setenta, sendo hoje a atividade que mais cresce no país. Tornou-se vital para a geração de “superávit” na balança comercial, como se verifica através de dados veiculados pelo Jornal O Povo (2004, p.25):

           "O superávit da balança comercial do agronegócio no Brasil entre janeiro e outubro superou o acumulado pela balança comercial como um todo. Enquanto as atividades econômicas ligadas ao campo registraram um superávit de US$ 29,03 bilhões, o comércio exterior brasileiro alcançou US$ 28,121 bilhões. A razão é simples. No agronegócio, que inclui agricultura, pecuária, máquinas e implementos agrícolas e fertilizantes, as exportações superam bastante as importações. No restante da economia, as compras externas estão crescendo, reduzindo o saldo do comércio exterior."

           Como se conclui, é o agronegócio responsável pelo bom desempenho que vem sendo obtido pelo Brasil na balança comercial. Segundo, ainda, a mesma fonte acima referida “As exportações de produtos agrícolas somaram US$ 33,054 bilhões no acumulado até outubro, outro recorde. Os embarques de produtos agrícolas cresceram 29,5% na comparação com igual período de 2003”.

           É evidente que o Brasil dispõe de condições peculiares para a atividade agropecuária, como clima privilegiado, solo fértil, disponibilidade de água e inigualável biodiversidade, além de mão-de-obra qualificada, mas para que o país atingisse o atual grau de desenvolvimento, o governo investiu na modernidade da atividade rural, oferecendo ao produtor o necessário estímulo, como crédito, preços mínimos e seguro rural.

           Paradoxalmente, questiona-se a forma de direcionamento desses recursos, porque não se concebe que se insista em uma política agrícola excludente, considerando que o país tem todas as condições necessárias para conciliar o cultivo da agricultura de exportação com o da agricultura de subsistência e para o consumo interno. O governo tem o dever de solucionar esse problema o mais rapidamente possível, considerando que é inaceitável mandar-se alimento para todos os recantos do planeta, visando a obter “superávit” na balança comercial, em detrimento de uma parcela expressiva da população que vive abaixo da linha da pobreza.

           Essa corrente que considera ser o agronegócio muito importante para a economia brasileira, no entanto, não é unânime, pois há quem entenda que esse modelo que privilegia a agricultura empresarial é ultrapassado e não atende aos interesses do povo brasileiro. Sobre essa outra corrente, comenta Stédile (2005, p.02):

           "Porque o modelo agrícola do agronegócio é organizado para produzir dólares, e produtos que interessam aos europeus, os asiáticos, não aos brasileiros. E por isso não produz comida, empregos e justiça social. O agronegócio concentra. Leva para fora as riquezas produzidas aqui, em vez de distribuí-las."

           Na visão dessa corrente, não haverá progresso na atividade rural, enquanto não se fizer uma reforma agrária, porque sem isso não há modernidade no campo. Segundo a mesma fonte:

           "Se o Brasil quiser resolver os problemas de emprego, pobreza no meio rural e desigualdade social, certamente não será pelo caminho do agronegócio. Será pela reforma agrária, que é a democratização da propriedade da terra. Pela organização da produção agrícola através da agricultura familiar, e orientando a produção para alimentos destinados ao mercado interno, para o povo. Se todo o povo brasileiro tivesse renda para se alimentar direito, haveria uma demanda nacional infinitamente superior ao que hoje é exportado. A solução é dar condições para o povo comprar comida." (STÉDILE, 2005, p.04).

           Stédile, como líder do MST, não pode defender um modelo de política para o campo que não privilegie a reforma agrária. Por outro lado, no entanto, tem-se que considerar que as questões por ele defendidas não podem ser descartadas, porque muito embora ninguém possa negar ser importante para a economia do país o grande volume de exportação advinda do agronegócio, a ninguém passa despercebido que o governo prioriza demais a agricultura empresarial, tanto que dos R$ 46,45 bilhões que estão sendo destinados para a safra 2004/2005, apenas pouco mais de 15% serão alocados para a agricultura familiar.

           Ao longo da história, o Brasil fez agricultura de exportação, em que a necessidade de divisas sempre obrigou o governo a priorizar esse tipo de produção em detrimento da agricultura de subsistência e da produção para o mercado interno. O Brasil não deve desprezar o agronegócio para o mercado externo, mas é hora de encontrar um meio termo, de forma a equilibrar as políticas agrícolas, visto que há uma necessidade urgente de erradicar, de uma vez por todas, o problema da fome na sociedade.

           O que é absolutamente inconcebível é ocupar a terceira posição entre os maiores produtores de alimento do planeta e ter milhões de pessoas sem ter o que comer. Espera-se que o atual governo equacione essa delicada questão, que muito envergonha o país. A agricultura de exportação emprega pouco, vez que utiliza tecnologia de ponta, concorrendo para a redução de mão-de-obra e o conseqüente êxodo rural, conforme explica Silva (1999, p.89):

           "O lado perverso do desenvolvimento da agricultura, também marcada pela competição desenfreada, refere-se ao fato de que, ao se conseguirem grandes produções (supersafras) via aumento da produtividade (da terra e do trabalho), muitos agricultores, principalmente os pequenos, e os trabalhadores rurais acabam sendo excluídos do processo produtivo e encontram enormes dificuldades para serem reabsorvidos pelo mercado de trabalho, seja rural, seja urbano."

           A agricultura de exportação tem a sua importância porque gera divisas para o país; por outro lado, ocupa grandes áreas de terras produtivas e nem sempre absorve muita mão-de-obra. A soja, por exemplo, ocupa hoje em torno de 14 milhões de hectares, cerca 25% de toda a área brasileira produtora de grãos, e, no entanto, responde por menos de 6% da demanda de mão-de-obra agrícola, ficando muito atrás do milho, do café, do feijão, da mandioca, da cana-de-açúcar e do arroz.

           Muito embora sejam inegáveis os investimentos na atividade agropecuária, houve, de 1970, quando efetivamente se acelerou o processo de modernização da atividade rural no Brasil, aos dias atuais, um acentuado crescimento do êxodo rural, dados significativos que demonstram a grande dificuldade de fixar o homem no campo, como se verifica pelas informações de Vesentini (2001, p.191):

           "De 1970 a 2000, ocorreu diminuição da população rural tanto relativa (44% para 18,8% do total), como absoluta (de 41,1 milhões para 31,8 milhões). Nas décadas anteriores já vinha ocorrendo declínio da proporção dos habitantes do campo em relação aos das cidades. No entanto, esse declínio, que se acentuou a partir de 1950, era relativo e não absoluto. O êxodo rural foi mais acentuado nas décadas posteriores a 1970."

           A agricultura brasileira tem algumas peculiaridades que merecem serem ressaltadas, pois além da exploração de certas culturas se dar por um reduzido número de grandes latifundiários, há o problema da concentração da ocupação de mão-de-obra em seis culturas: arroz, café, cana-de-açúcar, feijão, mandioca e milho. Em 2000, esse conjunto de lavouras respondeu por 67,5% do total de equivalentes-homens-ano demandados pelas principais culturas no país e por 59,1% da área cultivada. A agricultura é hoje, inquestionavelmente, a atividade mais importante do país, porque, além de gerar muitos empregos, alimenta a população e traz divisas, que são indispensáveis para o equilíbrio das contas externas. Por isso se faz necessário criar condições para viabilizar um melhor acesso à terra e incentivar indiscriminadamente todos os produtores rurais.